31 de jul. de 2012

Querida L.

                Olha só, vou começar essa carta assim. Exatamente desse jeito.
                Com todos esses espaços e parágrafos, porque é cedo demais para te ligar e o dia mal começou para que eu possa pensar em me matar, por mais que eu pense – às vezes.
                Sei que tem muito tempo que não te escrevo algo substancial, mas sabe como são essas coisas e como eu sou desligado do mundo e de pessoas que estão – e são – distantes.
                Não tenho muito que dizer. O pé de amora morreu, perdi meu emprego, e, talvez publique meu primeiro livro. Você sempre leu tudo que escrevi e apesar de nunca dizer nada além de: “Nossa que sentimental” e achar que não levo jeito, algumas pessoas pareceram gostar.
                Recebi um bom adiantamento e as coisas estão relativamente encaminhadas. Não, eu não parei de fumar, ou beber, fuder e querer você de novo. Velhos hábitos são difíceis de perder. Acordei cedo porque tive um sonho estranho.
                Você não vai receber essa carta na hora em que escrevi.
                Bom... Sonhei que éramos adolescentes de novo e que namorávamos, eu era só mais um garoto tentando se encontrar e com uma única certeza, você. Pegávamos algum curso extra, inglês ou francês, não lembro ao certo e eu te deixava em casa todos os dias. Você era ainda mais linda que hoje. Nosso maior problema era contar ao seu pai porque sua mãe parecia bem com isso e até nos ajudava algumas vezes. Engraçado, eu sei.
                Passávamos horas sentados em algum lugar entre a minha casa e a sua, sem uma sombra sequer, só as nuvens, o céu azul, o sol fresco marcando o final do inverno, a grama verde e beijos, muitos beijos e carinhos.
                Era inocente, puro. Não que a tensão sexual não existisse, ela só não era prioridade.
                Eu só queria você de qualquer jeito. Não sei se é um pouco tarde pra isso, mas eu ainda quero.
                Você era uma garota meio confusa, bem extrema com relação a bebidas, cigarros e música. Não muito diferente de hoje na verdade.  No sonho eu também não sabia como conversar com você sem parecer alguém com sérios problemas mentais, assim como hoje. Não sabia o que falar e passava boa parte do nosso tempo juntos calado ou te provocando, você também tinha problemas em entender meu sarcasmo e parecia não gostar muito de mim.
                Mas eu estava feliz.
                O sonho durou por meses, não que tenha durado mesmo, mas pareceu.
                Ainda te conheço muito bem, sei o que te irrita e por mais você não seja a adolescente estranha e um pouco fora do padrão que eu convivi em meu sonho ainda quero você de qualquer jeito. Não sei se é um pouco tarde pra isso, mas eu quero.
                Acho que vou ser sempre louco por você. De um infiel apaixonado qualquer do seu passado, J.


30 de jul. de 2012

Vive la France!


                Tá no jeito que ela escolhe o perfume, brinca serelepe na água e pega com esses dedos delicados o cigarro, e, no jeito que mexe com o cabelo como se não quisesse te deixar em um estado diferente. Tá na risada boa depois de algo banal e, principalmente, no jeito que brinca com a água.
                Poderiam escrever livros e teses sobre isso que é tão bonitinho, clichê e tão, mas realmente tão, francês.
                Mulheres (suspiros)A... As mulheres francesas. 




 

Em aberto

                Se ele soubesse o que aconteceria naquela noite teria ido mais cedo, vestido de cangaceiro e com um sorriso nos lábios. Se ele soubesse. Mas ele não sabia, ainda bem. Por não estar interessado em ninguém conheceu uma das pessoas mais interessantes que já cruzaram seu caminho.
                Trocaram olhares, palavras, carinhos. Cético passou contato, não achou que ela o procuraria. Afinal porque alguém iria se interessar por mais de uma noite com um universitário quebrado. Ele crente que nunca mais a veria desabafou no papel. O uísque como amigo, folha e caneta como confidentes.
                Agora eu tento explicar a vocês o porquê de tudo isso. Ele sempre quis uma mulher em sua vida, até hoje só tinha encontrado garotas. Ela era diferente. Ele percebeu isso nas primeiras palavras trocadas.
                Pessoas têm o péssimo habito de acreditar que outras pessoas deveriam vir sem passado e sem bagagem emocional. Não ele. Sempre se atraiu por tipos de passado duvidoso, de problemas emocionais difíceis demais de se resolverem em uma semana ou duas.
                Ela se encaixava perfeitamente em tudo o que ele sempre quis. Uma mulher. Ela era daquelas de beleza simples, coração esperançoso que não negava o cansaço e ainda acreditava mesmo que não  parecesse na sinceridade alheia.
                Ele se rendeu aos encantos e acalantos daquela moça de cabelos escuros, pele branca, sorriso fácil e fala mansa. A noite passou lenta depois que se conheceram, viveram tantas coisas em poucas horas. Ela chorou magoas de outro amor, ele deixou escapar segredos.
                A química foi intensa. Não seria de outro jeito, não com os dois. Ela dizia que isso acontecia porque ele era de libra e ela de escorpião, ele só culpava a cumplicidade mesmo. Durante horas foram testemunha, cúmplices e confidentes.
                Passaram pela loucura de fazer coisas que não se devem ser feitas na rua, “calor do momento” ela dizia. Ele sabia que não. Não era o calor do momento, era a vontade presente em ambos. Vontade que persiste ainda se me permitem falar.
                Aquela noite se foi, na manhã do outro dia, bem cedo, ela pegou estrada de volta a sua vida, deixando pra traz o que chamaria mais tarde de noite surreal. Ele voltou para sua rotina desregulada, noites sem dormir, mulheres sem sentido e tudo mais.
                O engraçado é que ele não desistiu dela, ainda pensa em ir visitá-la, ver aquele sorriso lindo novamente de perto, beijá-la e amá-la o quanto puder, até se for por apenas mais uma noite.
                Ela de vez em quando sonha com ele, coisas estranhas sem nexo, mas acorda feliz. Com uma saudade leve no peito, daquelas boas de sentir.

29 de jul. de 2012

Lady Madonna

                Bom, às vezes a idade não significa muita coisa. Essa menina, por exemplo, era três anos mais nova que ele e obedecia os padrões Disney de moda, mas tinha um prazer imenso em ler, ouvir Beatles e gostava principalmente de provocar.
                Provocava.
                Mesmo que não de maneira direta ou intencional, mas provocava. Com aqueles grandes olhos escuros e as boas piscadas quando te olhava diretamente. Provocava pela aparência desenvolvida e o riso de menina que fazia o corpo de mulher tremer.
                Com belos seios, um pescoço de fazer qualquer ser consciente desejar um pedaço na boca a qualquer hora do dia ou noite, lábios carnudos e um jeitinho carinhoso meio bruta, assim como todo bom goiano.
                Provocava por saber onde tocar e o que falar, provocava pelo riso sacana de quando puxava o pobre rapaz para o banheiro de algum lugar e beijava a boca com a vontade de quem bebe água em uma tarde de verão quente e seca.
                Provocava por não estar sempre presente e ter a manha de deixar na mente a vontade, ela sabia onde pisar e até quando era o momento certo de ficar brava.
                Aquela era uma boa garota...
                E, por mais que tenham tomado rumos distintos, ele ainda se sente provocado quando num domingo preguiçoso olha para cama e vê alguém vestindo alguma de suas camisetas surradas de uma banda pouco conhecida deixando a mostra à voltinha da bunda, os pezinhos balançando, o cabelo preso, óculos com modelo meio estranho e a lente com grau um pouco mais alto lendo algum livro iraniano.

15 de jul. de 2012

Jardim Panorâmico, quarto canteiro.

                É Flor, nosso tempo passou assim como passa o tempo mesmo. Você mudou, eu mudei. Passou. Como passa uma música, uma dança.
                Você escolheu outro par.
                Eu não liguei, ainda não ligo.
                Me incomoda pensar que, talvez, você poderia ter sido um caminho certo.
                É Flor, nossa dança acabou. Nossos olhares não se cruzam mais e nem se procuram longe na festa. Pois é Flor... Você seguiu seu rumo, eu segui minha Lua.
                Você parece feliz, isso é bom, seu sorriso é bonito.
                É isso Flor, gentil da sua parte seguir em frente e superar suas barreiras. Mas a nossa dança acabou antes mesmo de começar. E, eu não me sinto mal.
                Gentil da sua parte não ter acreditado nas promessas que fiz. Eu queria cumpri-las, mas tenho um tempo diferente do mundo. Seu tempo passou, seu tempo comigo passou, o meu com você nem chegou.
                É bom te ver assim.
                Uma garota a menos com a vida arruinada.
                Acho que sem mais Flor Gentil.

13 de jul. de 2012

19 O tesouro de um homem

               É estúpido pensar que é possível institucionalizar o rock’n roll. Não se pode segurar algo tão rebelde e esperar que ele se contente em ficar em casa. Quando Jerry Lee Lewis dançou a “Great Balls of fire” pela primeira vez, ele não tinha a Calçada da Fama do Rock’n Roll em vista ou algum museu. Na verdade, as palavras  “rock’n roll” e “museu” não deveriam nem mesmo aparecer na mesma frase.
                E, no entanto, considerando a última leva sincronizada de lábios com seios siliconados e bandas de garotos frescos, eu, de má vontade, concluí que a Calçada da Fama do Rock’n Roll é um mal necessário. Como uma cultura, é nossa incumbência mostrar à próxima geração que as estrelas do rock foram uma vez descobertas na boate Marquee, e não no Mickey Mouse Club. Pessoalmente, não vejo necessidade de visitar a Calçada da Fama do Rock’n Roll tão cedo. Mas como arquivista e historiador estou feliz por ela existir. Desde que nunca desmantelem a exposição de Muddy Waters para abrir espaço para a exposição de Justin Timberlake. 





Bill German em Under Their Thumbs pag.: 210